segunda-feira, 6 de junho de 2011

Não me despedi.

Meu amor. Você estava lá, frágil. Segurava forte em meu braço quando queria se locomover. Me pregava peças do melhor jeito que sua condição permitia. Oh, meu Deus! Mais de um ano.
Me chamou discretamente, perguntou se estava incomodando e lógico que respondi que não. Pediu ajuda para tomar banho. Meus olhos, pobres olhos, se encheram de lágrimas, mas não devia chorar na sua frente. Logo você, orgulhosa, pedindo ajuda para o banho.
Não podia negar seu pedido. Fui forte como sei que seria por mim. A levei até o banheiro, segurei suas mãos e tirei seu pijama. Suas cicatrizes, apesar de virem da cirurgia, estava mais do que óbvio que pareciam cicatrizes de guerra. Anestesia, jovens médicos, câncer. Cortaram seu pulmão, o esquerdo. 
Quase caiu, se agarrou em mim. Suplicou: "Não me deixe cair". Sentou na cadeira, liguei o chuveiro e ajustei na temperatura correta. Coloquei a água em suas costas e me olhou, hesitou duas vezes, coisa que também faço e disse:
       - Sabe, estou feliz por estar viva, ter vocês que me amam tanto ao meu lado - seus olhos transbordaram - mas... não suporto mais tanta dor.
Nunca a ouvi reclamar de nada, em toda minha vida. Mas o fez desta vez. O banho não demorou, pois não arriscaria pegar uma pneumonia. Se enrolou na toalha, com minha ajuda. Me abraçou e se vestiu com uma dificuldade imensa. Seu cheiro ainda era mesmo de dez anos atrás, seus cabelos agora caiam e seu corpo pesava apenas quarenta e nove quilos. Desta vez eu cuidava de você, retribuindo os anos que cuidou de mim.
Fiquei meses sem me olhar no espelho depois que você partiu, todos dizem como sou parecida com você. Mesmos olhos, cabelos, sorriso, orgulho, prepotência, honestidade. Foste a melhor coisa que me aconteceu. 
Lembro de quando escondia seus chinelos, dizia que só os devolveria quando me contasse uma de suas histórias. Você sempre sabia onde eles estavam, mas não se importava. Contava as histórias mesmo assim. Depois no almoço cozinhava duas dúzias de ovos de codorna, comíamos todos eles. Sozinhas. Vivemos nesse mundo durante dois anos. Tudo que sou hoje é você. 
Quero você aqui comigo, beijar seu rosto marcado pelo tempo, segurar em suas mãos delicadas, sentar em seu colo. Vovó, quero dizer o quanto te amo. 
Não acredito que tenha ido para um lugar melhor, muito menos que esteja me observando lá de cima. Mas sei que esta aqui dentro, no meu coração, também sei que nunca irá sair. Pois não há outro lugar no mundo que possa lhe acolher com o luxo que merece. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário